Na próxima terça-feira (24), o Tribunal Constitucional da Itália analisará a constitucionalidade do reconhecimento da cidadania italiana com base na descendência sanguínea (ius sanguinis), previsto ainda na Lei 91/1992.
É importante destacar que a audiência examinará a questão de maneira independente à Lei 74/2025 — ou seja, a decisão não acarretará mudanças diretas na atual legislação. Além disso, a lei italiana de 92 não está mais em vigor desde o dia 24 de abril de 2025.
Contudo, a decisão dos juízes do Tribunal Constitucional poderá reforçar ou até mesmo mudar o posicionamento do judiciário italiano em relação à lei que assegura o direito à cidadania por descendência.
Contexto
Em 26 de novembro de 2024, uma família brasileira, composta por 12 membros, solicitava o reconhecimento da cidadania italiana por meio de um ancestral italiano nascido em 1876.
Contudo, o Tribunal de Bolonha, responsável na análise do caso, levantou uma exceção de ilegitimidade constitucional na parte que prevê a transmissão da cidadania ius sanguinis sem qualquer limite temporal.
De acordo com o Juíz designado para o caso, Marco Gattuso, “a cidadania identifica o elemento constitutivo do povo, cuja soberania é reconhecida pela Carta Constitucional. É o critério que permite distinguir o povo dos outros povos: seria, portanto, ilegítimo reconhecer a soberania àqueles que nunca tiveram nada a ver com o nosso país (Itália)”.
Em outras palavras, o Tribunal de Bolonha, por meio da revogação do reconhecimento da família brasileira, tentou evidenciar a suposta ilogicidade da norma que permite que ítalo-descendentes, residentes no exterior, e que, aparentemente, “não possuem laços culturais com a Itália”, possam adquirir a cidadania italiana.
Por meio desse ato, o Tribunal de Bolonha levou o caso ao Tribunal Constitucional para avaliar se a cidadania italiana, baseada na presença de um ascendente de gerações distantes, “sem a formação de laços linguísticos ou tradicionais”, segue o conceito de povo estabelecido na Constituição do país.
Outra perspectiva: Tribunal de Campobasso
Em contrapartida, no dia 1º de maio de 2025, período antes do decreto 36 ser convertido na lei 74/2025 (fato que só ocorreu no dia 24 de abril), o Tribunal de Campobasso rejeitou uma contestação à constitucionalidade semelhante à de Bolonha.
Na ocasião, o juiz de Campobasso defendeu a Lei 91/1992 — que ainda estava em vigor — alegando que ela estava totalmente alinhada com os princípios ius sanguinis estabelecidos pela Constituição italiana.
Lembrando que na mesma época, o Decreto-lei n.º 36/2025, aprovado com urgência, sem debate público e passagem pelo Parlamento, estabelecia que somente descendentes até 2º geração (filho ou neto) poderiam requerer a cidadania.
A decisão tomada pelo Tribunal de Campobasso, por ir contra aos limites estabelecidos pelo decreto, reforçou o entendimento sobre a cidadania por descendência, enfatizando a importância histórica e cultural que a diáspora italiana representa (ou pelo menos deveria representar) para o país.
Influência dessas duas decisões na nova lei de cidadania
De antemão, entenda que o resultado da audiência não terá nenhuma influência sobre a Lei 74/2025, em vigor desde 24 de abril de 2025.
Porém, as duas decisões (Bolonha e Campobasso), embora relacionadas somente à antiga legislação de 1992, ainda assim levaram importantes questionamentos sobre a nova lei de cidadania para o Tribunal Constitucional da Itália — tribunal responsável em julgar as controvérsias constitucionais do país.
Especialistas afirmam que a atual legislação também deverá passar por audiência na mesma Corte no primeiro semestre do próximo ano (2026).
Ou seja, o resultado da audiência do dia 24 junho, em um sentido amplo do entendimento legislativo italiano, poderá servir como uma prévia da comprovação da inconstitucionalidade da atual lei em vigor.
Representando, assim, o renascimento da esperança nos ítalo-descendentes que tiveram o direito à cidadania cerceado com a recente decisão do governo italiano.
Em resumo…
Aspecto | Lei 74/2025 | Audiência 24/06 |
Origem | Decisão do Parlamento | Questionamento judicial |
Situação | Em vigor | Julgamento pendente, contudo a lei 91/1992 não está mais em vigor |
Foco | Restringir o acesso à cidadania | Analisar se a lei 91/1992 é constitucional |
Interação | Pode ser impactada pela decisão da Corte Constitucional do dia 24 de junho | Pode influenciar futuras revogações ou reforços legais da legislação atual |
Consequência possível | Manutenção das novas regras | Invalidação parcial do atual entendimento sobre o ius sanguinis |